sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Marc Bolan: o godfather do punk


Por CRISTIANO BASTOS

Década de 1970. Músicas de 26 minutos e quarenta e sete segundos: elas existem, pode crer. Sons tão complexos quanto o Alcorão e mais caudalosos do que o Niágara desaguam dos sulcos dos vinis. Valei-me hipérbole!

Quase vira este o único modelo de uma geração que estava apenas crescendo nos ‘70, mas pouco – ou nada – tinha a ver com a mania de grandeza sonora inventada pelos roqueiros. Grandes músicos, ocupados com viagens egoastrais que mal cabiam nos LP’s, nem se tocavam que parte da juventude da época não sintonizava em freqüência igual a deles.

O decênio nascia com a ressaca dos sixties e, de largada, prometia combinações completamente diferentes: individualismo com hedonismo, niilismo com diversão, perdição com drogadição. O futuro, enfim, era bem mais excitante que o recente passado – que trouxera a “espátula”. O presente vinha com o bolo: desperdiçara-se um tempão afofando a massa – chegara a hora da juventude pop atacar!

Só que velhos hábitos são uma praga: “Me descola mais tempo num lado que ocupo na boa”, seria frase possível de ouvir escapar da boca de um músico, por volta de 1972, insatisfeito com o tempo disponível num álbum.

Se rock progressivo clássico fosse coisa atual, com as ilimitadas mídias que se têm por aí, hoje em dia, não se pode duvidar: esses mesmos caras fariam músicas de 24 horas, de uma semana, quem sabe meses e anos até (!). Expedições musicais com nascimento, desenvolvimento e morte da música; inclusive, do próprio músico. Tais epopéias só foram “impedidas” porque a pulsão que movia o prog-rock, em seu contexto histórico, atualmente não existe com a mesma intensidade. Projeto: Música para uma Vida Inteira.

PLANETA TERRA: 1972-1977 – Reich absoluto do rock progressivo. Bandas de duas toneladas e meia deixam pegadas maiores que a de King-Kong, a cada pisada. Os ouvidos dos jovens são massacrados pela megalomania dos rockstars de bata indiana. Tempos há muuuito deletados – dos lados A & B, dos estéreos, das agulhas, das jaquetas LEE, da revista Pop! Dos singles.

Nos rock setentista ser grande era documento: calçar grandes orgias, cheirar grandes botas de plataforma, dar grandes quantidades de cocaína (porque LSD tava fora de moda) – e, sim, fazer grandes shows, compor canções eternas e gravar grandes álbuns.
Mas o rock, que nascera bebê dinossauro, perdera seu “sentido original”, sua sacanagem e muito de sua direção; não era mais barulhento, se não fosse apoteótico, e para ser pop, obrigatoriamente, era pasteurizado como leite Molico.

Aos dezessete minutos e meio do solo do teclado em alguma arena gigante, as primárias cláusulas firmadas no pacto fechado por Robert Johnson com Satã, o Pai do Rock, foram olvidadas nalguma encruzilhada do velho sul.

O rock tinha crescido e tornado-se tudo, menos endiabrado: as excessões, Led Zeppelin e Black Sabbath, o impediam de ficar adulto duma vez por todas. A tutela do Diabo fora escanteada e, agora, passara-se a negociar (às portas fechadas) com as poderosas majors. Essas companhias biliardárias passaram a representar a figura paterna e bastarda do capeta: tinham os contratos, mas eram apenas “padrastos” e “madrastas”. A alma ainda pertencia a Louis Cypher…

Até o punk implodir o rock, em 1977 – com o start “oficial” dos Sex Pistols, na Inglaterra, e seu séquito de bandas – houve uma mente que vislumbrou toda a revolução cinco anos antes pelo menos: Marc Bolan.

Bolan viu que tudo andava muito chato e adulto e retomou as rédeas do negócio pro Diabo. A diversão com sensibilidade e genialidade recobrava sua cativa cadeira após muitos anos. O capeta deu a maior força.

GODFATHER – Por isso, entre os britânicos, Marc Bolan é chamado de “The Godfather of Punk”. Mas daí alguém poderá dizer: “Mas ele era glitter! Nada a ver. Olha só o cabelo dele! E as roupas?! O sonzinho: punk?”.

De primeira, pode ser que você não caia na feitiçaria de Bolan e, muito menos, saque direito como ele comunica sua misteriosa música. Ouvindo passa-se a entender, porém, que ele foi único: o que mais impressiona é sua simplicidade.

Bolan era tão simples – e sempre muito exigente – que, segundo o preodutor de longa data do T-Rex, Tony Visconti, se não acertava uma canção em três takes logo desencantava. Marc Bolan transformou-se no grande herói dos adolescentes que, cinco anos mais a frente, assumiram o punk e pós-punk na troca da guarda do glitter rock.

Os jovens eram Morrisey, Sioux-Sioux, Johnny Marr, Billy Idol, Steve Jones – esse pessoal, todos fãs. Quando Bolan teve o seu televisivo em 1977, Marc Shows, na TV Granada, o artista “deu força” pra todas as incipientes bandas punk da época, do Generation X ao The Jam.

David Bowie foi amigo e rival. Confesso admirador que, um dia, entregou sua relativa inveja do amigo:

“Nunca tive nenhum adversário na Inglaterra, a não ser Marc Bolan. Eu tentei como um louco colocá-lo na lona. Na teoria eu sabia que isso era bobagem, mas na prática eu realmente queria acabar com ele de qualquer maneira”.

Bowie compôs para Marc Bolan a belíssima “Prettiest Star”, gravada no álbum Aladin Sane. Não precisa explicar mais nada. Em 1977, o Duke Magro cantou “Heroes” no programa de Bolan.

Marc Bolan foi “punk”. Todavia, de uma forma bem elegante, na realidade: recuperou o antigo rock simples dos pioneiros Elvis e Perkins e, nem por isso, deixou de sofisticá-lo com sua visão ultra-pessoal. Lembrou – para que nunca se esqueça novamente – que riffs são a alma do rock: foram inventados para deles abusar, lambuzar, variar e derivar.

A influência de Marc Bolan fez-se sentir em artistas dos estilos mais variados, os quais apareceram depois dele. Anacronicamente: Violent Femmes, Sig-Sig Sputnik, Patty Smith, Bauhaus, Guns’n’Roses (olha a cartola e o cabelo do Slash…), Supergrass, Kiss, Blondie, New York Dolls, Alice Cooper (Bolan tocou nas sessões de Billion Dollar Babies).

“Marc Bolan foi o primeiro artista que nos disse que o futuro era mais importante que o passado”, contou Morrisey na reportagem The Rise & Fall of The Ultimate ‘70 Superstar, capa da revista inglesa Mojo em maio de 2005.

ASGARD – Na tradição dos anos 1970, editar um single era o motivo para lançar, no lado A, a “música de trabalho”, aquela que promoveria o novo álbum. O precioso espaço do verso não era satisfatório para caber toda gradiloqüencia de viagens cósmico-conceituais.

Um disco com o roteiro a seguir poderia muito bem ter sido feito, se é que não foi. Antes de ler imagine as brumas de Asgard, o primeiro dos três mundos do universo nórdico:

“É o reino dos deuses. Em Asgard está situada Valhalla, o palácio dos guerreiros mortos em batalha. Também em uma região de Asgard está Vanaheim, a terra dos Vanir e Alfheim, a terra dos Elfos Luminosos. Em Asgard estão também os palácios de cada um dos deuses, como também Gladsheim, o grande santuário na Planície de Ida. (?)”

A fábula de Asgard, de jeito nenhum, caberia no formato pop – o comprimido formato clássico 2:24 min. Nem à base de censura. Então, os caras não davam a mínima pro lance. Leva a pensar que até os progressivos (os pré), um dia, foram mais simples. The Story of Simon Simopath, disco da banda Nirvana UK (a primeira a usar o nome), editado em 1967, é dessas histórias “contadas” de forma resumida. Consegue ser mais pop por ser menor.

Os fãs gastavam seus tostões com os singles, com média de três músicas por compacto: o laureado lado A e, de lambuja, uma ou duas canções no B. Se houvesse algo de bom no verso, lucro!

Poucos artistas deixavam a preguiça de lado para, no lado secundário, editar um par de canções tão excelentes quanto a apresentada na face principal. Afinal, provavelmente, as músicas do lado B, com muita chance, não estrelariam no novo álbum.

Marc Bolan viu que estava tudo errado e reverteu isso com grande efeito para a sua própria obra, repleta de singles de sucesso que alcançaram o Top of the Pops. Quem saiu ganhando mesmo foi o miserável público de rock que perambulava pelas lojas de discos virando-se com antigas bandas garageiras. Talvez seja por isso que Marc Bolan é considerado “realeza” na Inglaterra. O Dandy in the Underworld que abasteceu o “teenage dream”.

BOOGIE ON! – Por ordem, a melhor maneira de iniciar-se em Marc Bolan & T-Rex são os álbuns Eletric Warrior, a coletânea Bolan Boogie, e os discos The Slider e Tanx. Entretanto, a compilação Great Hits B-Sides (1972/1977), lançada pela Edsel, em 1994, tem algo de very special. Dada perfeição, cuidado e essmero de Bolan com suas produções, os b-sides reunidos nesse álbum possuem valor de verdadeiros “a-sides”.

Bolan teve muito cuidado em estúdio ao produzí-los: são pop no que de melhor o sentido dá à reciclada palavra. Reza que Bolan preocupava-se com a grana que os adolescentes gastariam comprando seus discos. Em troca, curtia presentear-lhes com os melhores pop songs que conseguisse gravar.

Great Hits B-Sides é relíquia essencial para todos fãs de T-Rex. Ouvintes casuais poderão ser fisgados pelo balanço manhoso de Marc Bolan. E daí um aviso: não tem volta.

No próximo post, comentarei todas os singles reunidos nessa compilação. É uma obrigação que tinha desde adolescente “comigo mesmo” e que, só agora, mobilizei-me para realizar. Após esses anos todos conclui o óbvio: o som continua maravilhosamente igual. Até porque nunca parei de ouvir a dourada coletânea.

Sim, claro, todos os lados A foram hits terrivelmente “grandes”, também. O próprio nome afirma grandeza: T-Rex. Espero que vocês se divirtam-se de montão, como eu mesmo fiz milhares de vezes.

Get it On!

FONTE:
http://urbanaque.com.br/wordpress1/2010/09/30/marc-bolan-o-godfather-do-punk/

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Baixe o álbum "ELECTRIC WARRIOR", de MARC BOLAN & T.REX!

LINK:
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